Uma mulher especial e livre

Uma mulher especial e livre

por Patrícia Villela Marino*

O dia 7 de fevereiro de 2023 ficará marcado em minha memória e, tenho certeza, na de toda a equipe do Instituto Humanitas360 e da marca Tereza. Naquela terça-feira chuvosa, fomos ao Centro de Progressão Penitenciária Feminino de São Miguel Paulista para abraçar uma mulher especial — e livre.

Flávia Maria da Silva esteve presente em todas as fases do ecossistema de cooperativas de mulheres presas e em situação de vulnerabilidade que criamos. Sua inclinação para liderança se mostrou desde a primeira oficina realizada na Penitenciária Feminina II de Tremembé, em 2018.

Presa ali em regime fechado desde 2012, Flávia tinha poucas esperanças no futuro. “Passei a pensar em desistir de viver, porque dentro do sistema prisional não existe reintegração social. Sem oportunidade de mudança, somos depositadas à lei da sobrevivência. Perdemos até mesmo nossas identidades, nos tornamos invisíveis”, ela nos contou em um depoimento.

Por um erro cometido ainda na juventude, em circunstâncias sociais desfavoráveis, Flávia poderia ter se tornado mais um número na guerra às drogas ou para o encarceramento em massa, políticas sustentadas pelo Estado apesar de sua ineficácia e perniciosidade.

Mas bastaram algumas mãos estendidas, aulas de corte e costura, horas de conversa e escuta — e a potência que havia ali desabrochou. Flávia tornou-se presidente da cooperativa formada em Tremembé, onde diversos produtos da marca Tereza nasceram. Na etiqueta deles, é possível ler a história dela e das muitas mulheres cujas vidas ajudou a transformar.

É por essa razão que a progressão de pena de Flávia para o regime aberto foi celebrada: na sua trajetória vemos a materialização de que é possível a reintegração social de presas e presos, de egressas e egressos do sistema prisional, sobretudo quando a sociedade civil se faz presente.

Recomeços
Não foi fornecido texto alternativo para esta imagem

Legenda: Com seu filho jardel, Flavia chega ao primeiro dia de aula na Universidade Zumbi dos Palmares Foto: Diego Silveira

A sua saída marca, antes de tudo, uma entre várias etapas na jornada de reintegração. A orientação jurídica e o suporte psicossocial que recebe da equipe H360 semanalmente foram e são fundamentais, bem como seu engajamento nas cooperativas e na marca Tereza.

No ano passado, ela também passou a estudar Direito na Universidade Zumbi dos Palmares, cujas aulas frequentou presencialmente mesmo em regime semiaberto. Ter pessoas que escutam e orientam, oportunidades de realização profissional e geração de renda, a chance de estudar: vejam como, para ser bem-sucedida, a ressocialização precisa ser multifatorial.

Tenho orgulho de fazer parte dessa história e de ter presenciado mais esta vitória de Flávia. Com alegria e esperança, lembro de seu depoimento:

“Hoje, posso falar de inclusão social e combate à criminalidade com propriedade, porque sou um resultado impactante dentro de uma sociedade ainda com tantos preconceitos. Encontrei pessoas como as da equipe do H360, que me acolheram e me abraçaram como um ser humano, independente do meu erro, me dando a oportunidade de me transformarem em uma mulher empreendedora, na empresária que sou.”

*Presidente do Instituto Humanitas360.

Conheça o Humanitas360