ESG na prática, além da sigla

ESG na prática, além da sigla

O tema ESG é cada vez mais presente no ambiente corporativo. Prova disso é que o termo esteve no topo de pesquisas no Google em 2020. Porém, é necessário saber onde acaba o discurso e começa a prática. Não basta apenas se intitular uma empresa ESG , é preciso mostrar serviço e principalmente exigir fiscalização e transparência.

Boas práticas ambientais, sociais e de governança tornaram-se indicadores para agregar valor financeiro às empresas de capital aberto. Isso abriu os olhos do mercado e também dos consumidores, que passaram a cobrar um posicionamento das corporações.

 

Essas práticas são essenciais para o desenvolvimento de um capitalismo consciente, que siga os ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU).

 

Elas transformam o modelo forjado no lucro pelo lucro em um sistema com propósito que, por sua vez, está ligado a um capitalismo que não está focado só nos acionistas, e vai gerar valor para todos, colaboradores, sociedade, planeta.

A importância do Capitalismo Consciente para as práticas ESG

 
 

Na prática, os conceitos do ESG não são tão simples como parecem. Por isso, é fundamental ter conhecimento de como eles podem ser aplicados na sua empresa antes de tirar os planos do papel.

(E)nvironmental – fator Ambiental

A primeira letra (E) refere-se às práticas relacionadas à proteção e preservação ambiental. Sua atuação pode se dar na atuação sustentável de questões como:

  • Aquecimento global e emissão de carbono;

  • Poluição do ar e da água;

  • Biodiversidade;

  • Desmatamento;

  • Eficiência energética;

  • Gestão de resíduos;

  • Escassez de água.

(S)ocial – fator Social

A segunda letra (S) fala sobre as ações voltadas para as pessoas que rodeiam esse universo. Entende-se desde colaboradores até os clientes, com ações como:

  • Satisfação dos clientes;

  • Proteção de dados e privacidade;

  • Diversidade e inclusão da equipe;

  • Engajamento dos funcionários;

  • Relacionamento com a comunidade;

  • Respeito aos direitos humanos e às leis trabalhistas.

(G)overnance – fator Governança

A última letra da sigla se refere à administração da empresa. São as ações realizadas pelos stakeholders, gestores e setores de RH e Compliance na busca por um ambiente saudável e inclusivo:

  • Composição do Conselho;

  • Estrutura do comitê de auditoria;

  • Conduta corporativa;

  • Remuneração dos executivos;

  • Relação com entidades do governo e políticos;

  • Existência de um canal de denúncias.

Realidade

“Existe um risco, no entanto, de que a proposta de levar boas práticas para as empresas acabe sendo mais marketing do que propriamente uma mudança de comportamento.”

Afinal, o ESG é mesmo uma realidade? Quais métricas são utilizadas para medir essas práticas? Quem fiscaliza isso? Algumas empresas aproveitam dessas ações para mascarar interesses financeiros?

“Primeira coisa quando se fala em ESG é que precisamos entender quais as padronagens e padrões mínimos que unificam essa prática, para que possamos entender o que está se fazendo quando se fala em ter um portfólio ESG. Assim, é possível fazer comparações”, ponderou Sérgio Leitão, presidente do Instituto Escolhas.

Essas dúvidas deixam em evidência uma falta de transparência do ESG. Não existe um órgão fiscalizador para analisar se o que está sendo divulgado é verdade. Faltam informações e parâmetros para realizar comparações e estabelecer metas.

A ONG Global Reporting Initiative (GRI) divulgou um relatório de parâmetros para as organizações seguirem, mas tudo passa pela divulgação das empresas que muitas vezes manipulam, editam ou omitem informações.

Alguns exemplos expõem a fragilidade desse sistema. Empresas consideradas ESG, como o Nubank, XP Investimentos e Carrefour, recentemente enfrentaram crises, onde foi exposto o racismo estrutural existente nas instituições. O caso do Carrefour ganhou repercussão nacional com o assassinato de um homem negro. Os seguranças do supermercado espancaram João Alberto Freitas, de 40 anos, até a morte.

No aspecto ambiental, uma pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), em 2018, analisou mais de 500 embalagens de produtos para comprovar a prática do greenwashing. Os resultados identificaram que em 48% das embalagens foram encontradas informações falsas sobre a responsabilidade ambiental.

“Não é possível fazer comparações. Não consigo saber se um relatório de um banco que tem essas práticas é real, quais foram as métricas utilizadas. Então, a primeira questão é: falta transparência para que a gente possa comparar, avaliar e acreditar qual é o universo real de comparação e de checagem quando alguém diz que tem boas práticas”, ressaltou Leitão.

Filtros

Mesmo não existindo uma fiscalização efetiva, alguns filtros são aplicados para avaliar essas práticas. As empresas a serem investidas podem fazer parte da carteira, desde que suas notas ESG menores sejam compensadas com a adoção de práticas reparativas nos setores ambientais, sociais e de governança. Tais atitudes resultam em uma melhora nos fatores que deprimem essa nota.

Além disso, se uma empresa passa por um evento gravíssimo (por exemplo, a Vale, no caso Brumadinho), ela fica proibida de entrar nos fundos ESG por, no mínimo, dois anos.

O mercado percebeu que, para fugir das armadilhas, era preciso investir em pesquisas e gerar conhecimento. Após debruçar na matriz de materialidade de cada empresa, as investidoras criam pesos diferentes para realizar os filtros e assim traçar parâmetros e métricas nas áreas ambientais, sociais e de governança.

 

A consultoria global KPMG apontou no seu recente relatório “Measuring Stakeholder Capitalism: WEF IBC common metrics” (Medindo o Capitalismo de Stakeholder: WEF IBC métricas comuns) que ainda falta metrificar o quão bem as companhias estão se saindo em ESG em diferentes setores da indústria e locais de atuação.

 

No mesmo relatório foram apontados cinco pontos para medir o ESG de forma mais assertiva e padronizada:

1. Tópicos que impactam a empresa e a sociedade

Neste primeiro passo, a consultoria global destaca a necessidade de se realizar uma análise de melhores práticas; pesquisar tendências na indústria de atuação; identificar as preocupações das partes interessadas; desenvolver uma lista bruta de tópicos de potencial interesse, explorando cada um para compreender a sua relevância aos stakeholders; priorizar métricas que terão impacto na criação de valor sustentável para a empresa e confirmar os tópicos de ação com a administração e o conselho de administração do negócio.

2. Analisar as lacunas

Aqui é indicado que se avalie quais são os materiais de comparação com os dados mais atuais, para confrontá-los com os citados pelo Conselho Empresarial Internacional do Fórum Econômico Mundial e avaliar possíveis lacunas nas métricas em uso. E também desenvolver uma visão abrangente com as principais métricas antes de expandi-las.

3. Verificar a viabilidade para fechar as lacunas

Para este passo acontecer, a consultoria comenta que deve-se identificar se as métricas semelhantes às especificadas no relatório do Conselho Empresarial Internacional do Fórum Econômico Mundial podem ser modificadas e se há alguma restrição legal para relatá-las.

Além disso, o relatório aponta para o envolvimento das pessoas responsáveis pelo tema para avaliar a disponibilidade e confiabilidade dos dados e identificar métricas para dados ainda indisponíveis. Depois, revisar se os dados podem ser obtidos em curto ou longo prazo. Por fim, observar quais métricas não podem ser divulgadas.

4. Melhora nos sistemas de relatórios

O quarto passo inclui uma avaliação sobre a robustez do processo de relatório e controles atuais na companhia, se os dados já fazem parte dos relatórios financeiros.

Há ainda a indicação para envolver o departamento de auditoria da companhia e que se faça a integração das métricas no ciclo de relatórios. E também que exista o fortalecimento da governança de dados que não sejam confiáveis.

5. Relatórios e garantia

Neste último passo, a KPMG aponta que deve-se integrar as principais métricas aos relatórios convencionais e, como alternativa, que se considere incluí-las no relatório anual. E ainda há indicação para que se faça uma avaliação de prontidão dos dados.